12.5.10

Tratado sobre porra nenhuma

A natureza é bastante sábia. Ela dá ao homem um tempo de vida suficiente pra que ele possa compreender a si mesmo e nada mais. Mas o que cada homem faz com este tempo é problema de cada homem. A maioria coça o saco, vê TV e cheira o próprio peido enquanto sonha. Alguns vivem a sorrir e preferem não se aprofundar em questões mais complexas - estes também cheiram o próprio peido enquanto sonham. E muito raros são os que coçam o saco e, em vez de ver TV, se aprofundam no próprio sonho e no próprio peido. Engraçado, estes também cheiram o próprio peido enquanto sonham. Só que estes últimos, no final sorriem porque aprenderam algo de valioso.

Os ‘Últimos´ são aqueles que conseguem heroicamente compreender a si mesmos – mesmo que no final das contas estejam errados. São chamados assim porque essa luz que recebem vem por último. Depois de terem vivido toda uma vida, da qual só lhes restam vagas lembranças. Uma confortável sensação de poder metafísico toma conta do corpo por completo, anestesiando todos os traumas de infância e frustrações. Não sobra nada, você é o peido do Buda. O ‘ömn’ - sei lá como se escreve isso – ecoando no universo. Sem o fardo da matéria, você pode agora contemplar a imensidão da qual fazia parte e, enfim, compreender. É sublime. Por toda a eternidade, você será o peido do Buda, perfumando o vácuo universal.

Isso caso você seja um dos ‘últimos’, pois se não for, está fudido. Você simplesmente morre. Como uma calculadora de bateria fraca, seu pequeno cérebro começa a vacilar, cada vez mais e mais, até que a alma lhe abandona o corpo, que apodrece até ser inteiramente engolido por vermes. Haverá um funeral triste em sua homenagem e depois de poucos anos ninguém mais se lembrará de você. E logo em seguida, você voltará a vida na forma de um pequeno feto, uma lombriga nojentinha, como se houvessem apagado sua memória e recarregado suas baterias. Você terá pela frente outras dezenas de anos para ver TV, peidar e sonhar, e também para refletir, se lhe for viável. Será mais uma oportunidade de compreender e contemplar a si mesmo, e de acabar permanentemente com seu sofrimento.

Afinal, do que estou falando? Não sou yôgue nem espírita nem porra nenhuma. Eu nem acredito em ressurreição. Essa é só mais uma masturbação de palavras. Preferia antigamente, quando escrevia feito um amador e vivia como um profissional. Hoje, tento escrever como um profissional, mas vivo feito um paraplégico. Com uma cadeira de rodas sensacional. Eu: mais um jovem carioca, ao mesmo tempo ‘mutante’ de poderes duvidáveis e um aspirante a Dostoievski do Século XXII, definitivamente um subproduto qualquer da mídia insalubre. Deletérios e venenosos, é assim que somos todos nós que seduzimos algum público através de ideais vazios, e que com isso nos esvaziamos dos nossos próprios ideais. Poucos compreenderão o que digo, mas muitos acharão bonito. Não importa, eu compreendo e sofro, e então me divirto com isso. No final, sofro ainda mais, pois não há deboche no mundo capaz de consolar tanta miséria. Estou sendo dramático mais uma vez. Que se foda! Antes dramático do que superficial, este sempre foi meu lema.

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

"Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos." Fernando Pessoa.

1:14 PM  
Blogger Juliana Lohmann said...

Genial.

12:03 PM  

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